sábado, julho 27, 2013

Pústula

A perda é uma cócega
insignificante e
pouco incomodativa
Se não lhe tocares,
passar-te-á-sem grande mossa
Mas, se lhe mexeres,
correrás o risco de formares
uma pústula
Purulenta, rebentará, alastrará,
eventualmente, secará,
deixando cicatriz
Não te coces -
há dores que a consciência não suporta
como um cigarro não combusta
num copo de cristal tapado
e ficas ali, a vê-lo
extinguir-se, inoperante
E isso lembra-te a perda
e coças a pústula
e abres a ferida
e acumulas
cicatriz sobre cicatriz.

domingo, julho 21, 2013

Julho sem fogo

Imperial e petiscos com sal,
a lembrar o mar do sul
ou o mar Morto.
É quase Agosto
e não cheira a fogo
que a austeridade consome tudo
- até o oxigénio.
Em S. Bento, Belém
nos largos do Caldas e do Rato,
nada de fumo branco
A Sá da Costa fecha a porta
um popular barbudo
arremessa, da galeria,
um sapato à bancada socialista
- um desperdício, mas o calor
anula o dano.
O país não vai a banhos,
ninguém se vai aos arames
- ainda deve haver comida
para remediados repastos.

Mas eu já passei fome
de comida e, embora
não seja coisa que apeteça,
garanto que, para alguns de nós,
seria imperativo saciar outros apetites
Para o estômago, qualquer migalha
pode ser iguaria.
Para a alma reservo linhas
- da Doris, da Duras e das pautas
de música, que outros
lêem e tocam,
que, para essas, sou analfabeta
Mas continuo desnutrida
Abunda, mais do que o oxigénio,
a fome de cultura.

segunda-feira, julho 08, 2013

Madalena

Saudade apertada
como um abraço no vazio
auto constritivo
resignação complacente
contristada
incógnita sem x
x que não era incógnita
que tinha massa,
volume, corpo, forma,
cabelo brilhante,
pele imaculada
carácter ebúrneo
x que cintilava
que já não é x.
Memória insolúvel.

segunda-feira, julho 01, 2013

Chão

Amarelas, rolam pelo chão.

Parecem mimosas
mas não são.
Deveriam cheirar como tal
mas não.

Quando a alopécia dos jacarandás
fixa as solas ao solo,
eis que aparecem, mimosas,
as flores amarelas incógnitas,
definindo toda a leveza
salvando-nos da decomposição
e da seiva que, neste caso,
não gera nem alimenta,
apenas nos alicerça.