quinta-feira, dezembro 13, 2012

Ceux qui sont devenus (assez) timides


Comme une libélule ou une abeille folle,
je te cherche partout
et ce qui est désarmant
c’est que je te trouve,
ne t’en trouvant absolument pas,
dans ces bâtiments battues,
corrompus, avec du ciment qui abandonne
en miettes les murs que mes yeux ont,
eux mêmes, laissé tomber par terre
tel qu’une créature niobesque.
Le sol en boi imprégné de larves,
chacune fait des petits trous
pour boir mes chaudes larmes et mon nord perdu.
Cependent, je deviens vide et grotesque.
Mon âme pourri, il ne reste plus q’une bête urbanesque, désoeuvrée.
Comme la libélule, elles me manquent, les quenouilles. 

quarta-feira, novembro 21, 2012

Cervejaria

Catedral de cerveja e bifes
de lagostas em aquários
para nunca se lhes expirar o prazo
Independentemente do orçamento de estado,
a casa está sempre composta

Copos dourados e crepitantes
a carne é uma Cleópatra que nada em molho abundante
secundada por batatas fritas, esparregado e arroz
em pratos a montante

Como tudo isto seria mais vivo e saboroso
sob um olhar demiúrgico
Numa fracção de instante,
os lagostins fitar-se-iam
lagostas e sapateiras copulariam
as moreias moles e indolentas observariam
e as gambas, com minúsculas tenazes,
aplaudiriam,
as tentações de Santo Antão seriam nada
comparadas com a esquina vintecentista
desta movimentada avenida lisboeta

domingo, outubro 28, 2012

Aeroporto

Jardins com flores metálicas
voadoras e fálicas
com hangares quilométricos
        húngaros assimétricos
        britânicos pedantes
        germâncos rigorosos
        portugueses emigrantes
        gente lacrimejante
alguma de felicidade
outra pela antevisão da saudade
tudo mexe, mesmo na hora morta
tudo treme, nesta catedral da impermanência
Devia visitá-la com mais frequência

terça-feira, outubro 02, 2012

Xadrez

Chuva de outono
a que nos desabituámos,
tens uma música calmante
mas demasiado nostálgica
como o som do próprio tempo

porque o som das crianças à beira-mar
ou dos pés dando passos na areia
não nos leva a pensar em caveiras
nem no jogo de xadrez entre a morte e o jovem.

Quem joga xadrez no verão?

sábado, setembro 29, 2012

Mergulhemos

Quem disse que debruçarmo-nos sobre o papel
empunhando uma caneta
implica uma torrente de palavras
e de boa letra?
A maioria das combinações que tenho na frente
dava para encher uma estrumeira.
Mas se, porventura, pé ante pé,
pelas minhas costas,
de mim te acercasses e,
junto ao meu ouvido,
gentil e lento, soprasses
"Observa como são bonitas
as árvores",
se todos estes "ésses" sibilasses,
rebentaria em flor
ramos, vocábulos e mármores

Nos tempos silenciosos
com pouca feitiçaria e destreza,
penso tanto em ti
como na geração e na corrupção
como a água corre no rio.

Os meus ouvidos atentos
aguardam pelos teus silenciosos passos.

sábado, setembro 22, 2012

Tom

Mestre de cerimónias de plateias devotadas,
chegou com a trupe e os trapézios
mulheres suficientes para um triénio
música nas omoplatas
sapatos pretos bicudos
álcool e poeira mágica.
Num dos olhos trazia fogo
noutro água.

Em ambos vi o meu reflexo
e uma casa retorcida vazia

domingo, setembro 16, 2012

segunda-feira, setembro 03, 2012

Inês

O meu coração segue as contracções
de cada músculo teu.
Gostaria de fundir-me contigo,
saudade de quando éramos um corpo só.
Mas estamos obrigadas pela geração.

quinta-feira, agosto 23, 2012

miss

mar com saudade de lua
água sem vida
floresta deserta
ventre sem fruto
boca com sede
corpo com fome
alma sem mote
o barco quer a rede
transbordante de peixe

cresce
colhe-me da árvore
e mata-me
agora

sábado, agosto 11, 2012

alta pressão

se fitar esta calçada íngreme
que vai mergulhar no rio
confundir-me-ei com ele
à semelhança da cidade
e assim prestar tributo
às virtudes do tempo quente:
a fluidez macia
um peso ligeiro e perfumado
dança lenta
pescoço arqueado até à nuca
boca semiaberta
indiferente ao ar que sai e entra

quinta-feira, agosto 09, 2012

apneia

namoro-te em cada objecto com que me deparo
espreitas-me sobre o ombro quando me olho ao espelho
adivinho-te ao virar da esquina
ou oculto nesta e naquela sombra

leio-te em todas as páginas
de todos os livros, dicionários, enciclopédias,
periódicos sérios ou pasquins
tornaste-te o odor de cada prato que cozinho
para depois te comer
uma garfada após outra
e beber-te em goles de vinho

sinto-te tão meu
que és outro de mim

segunda-feira, agosto 06, 2012

tutela

de noite, adormeces-me no meu colo
afugento-te os pesadelos
limpo-te e alimento-te
beijo-te as feridas
ralho-te e perscruto-te sans césse
por isso pergunto
quem te protegerá de mim?
das minhas vagas
dos meus sonhos
das minhas paixões colossais
das minhas visões com cores garridas
quem te salvará do cativeiro maternal
e da minha essencial liberdade desgrenhada?

sábado, agosto 04, 2012

obrigada

sonhei-te e despiste-me dos anos
devolveste-me o sofrimento,
um coração congestionado e palpitante,
pelo que te agradeço tanto
a insegurança
as gargalhadas
o formigueiro
e as cócegas na alma

quinta-feira, agosto 02, 2012

post it

murmuro o teu nome à orla
mergulho e abro bem os olhos
engulo a água salgada
entro no meu portal do tempo
e ele lava-me as mazelas
e escaras terrestres
o sol tornou-se vela tremeluzente
a invocação do teu toque
tornou tudo incandescente
cada molécula de água
esculpe a tua imagem nos recifes
para que saibas que sou tua

sexta-feira, julho 27, 2012

rubor invisível

hoje dei por mim:

- a caminhar encostada aos azulejos do metro
para que me arrefecessem a pele dos meus ombros
e, arrepios vítreos

- a tocar ao de leve com as plantas dos pés na erva
para que me fizesse cócegas frescas,
pois mais parecia que caminhara sobre piso em brasa

- a inspirar fundo o odor do centro de arte moderna,
que sempre adorei, e a contemplar, no bar,
as fatias douradas

- a monologar com patos (adultos e crias)

jurei:

- não esquecer nada

- resolver tudo

- ter calma

- percorrer um trajecto rectilíneo e seguro

cometi perjúrio.
devia estar mesmo muito encalorada.

agora

deserto de areia, não repetimos a cara
apenas a substância
não sabemos como somos
                     como seremos

aqui estamos e, por isso, agradecemos
agora

agora não

terça-feira, julho 24, 2012

anelar

se eu pudesse
morava neste quiosque
observava as árvores o tempo todo
e fumava cigarros sem parar
via os rapazes a passar
e as raparigas também
embebedava-me em cada noite do estio
depois de um ocaso verde

de noite, recebia-te,
meu amante

domingo, maio 13, 2012

Ribeira

Ribeira, eras o nosso bazar
As flores e as cabeças de peixe
com olhos vítreos fitando uma última recordação de mar
no Tejo
boca entreaberta
que procurava uma última golfada de ar
fugindo aterrorizado da ideia de se tornar carcaça
vermelho vivo sucumbindo atrás da prata das gélidas escamas
até se vir sobre a bancada
e a posta de pescada
do cliente incauto
que morreria de asca
se conhecesse estas vicissitudes
do peixe que, apetitoso,
lhe jaz agora no prato

quarta-feira, janeiro 04, 2012

Geronte

Aquelas folhas
no chão
pertencem àquela árvore
Folhas verdejantes na copa,
lá medram sem cópula
e no outono caem pelo chão
A árvore ensimesmada
esquece-se de que lá estão
As folhas são jovens
As árvores persistirão